Longa dirigido por Nicolas Winding Refn mistura o belo e o grotesco ao discutir o mundo da moda.
“A verdadeira beleza é a moeda mais valiosa que nós temos”, diz um personagem em certo momento do filme Demônio de Neon, dirigido por Nicolas Winding Refn (Drive). O fato de a pessoa que diz isso ser um estilista é bastante significativo. Trata-se de alguém que lida com a beleza no seu dia-a-dia, e faz dela o seu sustento. E mais significativo ainda é que ele está se referindo à protagonista, interpretada por Elle Fanning, cuja beleza natural é uma espécie de diamante bruto, que foi recentemente esculpido após a sua primeira aparição nas passarelas. A partir daí, fica claro que a personalidade da jovem modelo não tem mais importância nessa realidade plástica na qual ela está inserida. É o seu valor de troca que importa. Agora, ela é um item valioso, ansiado por alguns, invejado por outros e atrativo a todos.
Escrito pelo próprio Refn em parceria com Mary Laws (série Preacher) e Polly Stenham (curta Eleanor), o roteiro acompanha Jesse (Fanning), uma jovem de 16 anos que se muda para Los Angeles para tentar a vida como modelo. Ela foi descoberta pelo fotógrafo Dean (Karl Glusman) que a chamou para um ensaio. As fotos ganham a atenção de uma agência de modelos, e logo Jesse começa a figurar em trabalhos de artistas conceituados nesse meio, todos atraídos não só pelas suas feições graciosas, mas também por um “algo a mais” que ela tem – essa tal moeda valiosa. E enquanto a maquiadora Ruby (Jena Malone), que estava presente naquela primeira sessão de fotos, se mostra atraída por Jesse, as modelos Gigi (Bella Heathcote) e Sarah (Abbey Lee) sentem ciúmes dela, uma vez que são passadas para trás pela jovem estrela em ascensão.
Desta forma, a história da garota interiorana que vai tentar a vida na cidade grande muda de tom à medida que a protagonista conquista seus objetivos. Quanto mais ela adentra no mundo da moda – que pode ser entendido como qualquer outro microcosmo, seja o do cinema, da música, etc –, mais ela perde a sua personalidade. Torna-se um objeto. Perfeito, mas um objeto. E como a maioria dos artefatos valiosos, ela gera inveja, ganância e até violência. Assim, suas ações não são mais importantes, mas sim o efeito que ela, como objeto, causa nos outros. E com isso, as personagens coadjuvantes – Ruby, Gigi e Sarah – ganham mais espaço.
O estilo quase experimental de Nicolas Winding Refn combina com o ambiente belo e irreal que ele se propõe a retratar. As cores são gritantes, a fotografia soa propositalmente falsa e as atuações são caracterizadas por movimentos lentos e pouca expressividade. E como também é de costume na filmografia do cineasta, a violência é exacerbada. Enquanto algumas cenas são grotescas (como aquela na qual Jena Malone se masturba no necrotério) outras encontram um meio termo entre a beleza voyeurística e o impacto daquilo que está sendo mostrado (o banho de sangue é um bom exemplo disso). É nesse meio termo que o diretor encontra o seu espaço. Ele emprega a sua visão exagerada e fantasiosa ao retratar um mundo exagerado e fantasioso.
A combinação de estilo narrativo e objeto retratado resulta em um filme indigesto, estranho e belo. Vaiado no Festival de Cannes, o longa não aceita meio termo na sua apreciação. Ou você ama Demônio de Neon, ou o odeia. Eu fiquei com a primeira opção.
Gênero: Suspense
País: Dinamarca, França, EUA
Ano: 2016
Direção: Nicolas Winding Refn
Roteiro: Nicolas Winding Refn, Mary Laws e Polly Stenham.
Elenco: Elle Fanning, Jena Malone, Bella Heathcote, Abbey Lee, Alessandro Nivola, Desmond Harrington, Christina Hendricks, Jamie Clayton, Charles Baker e Keanu Reeves.