Em julho de 1969, quando Neil Armstrong e Buzz Aldrin davam seus primeiros passos na Lua, parte da população mais carente dos Estados Unidos protestava contra aquele feito histórico e científico. E suas reclamações eram válidas.
Na época, o programa Apollo custou cerca de US$ 25 bilhões (o equivalente a 150 bilhões hoje em dia). E enquanto o governo gastava fortunas com a corrida espacial, a comunidade negra passava fome e o país continuava envolvido no conflito do Vietnã, enviando milhares de jovens para a morte todos os dias.
A ideia de olhar para o lado de fora pareceu, àqueles que a criticavam, uma forma de ignorar a realidade do lado de dentro. Ad Astra – Rumo às Estrelas parte de uma crítica similar, mas oferece uma abordagem mais intimista.
Escrito pelo diretor James Gray (A Cidade Perdida de Z) em parceria com Ethan Gross (série Fringe), o roteiro se passa em um futuro próximo, quando a humanidade já avançou na exploração espacial. Viagens à lua tornaram-se rotineiras a quem consegue pagá-las e uma base em Marte foi estabelecida, como ponto de partida para jornadas mais longas.
A trama acompanha o astronauta Roy McBride (Brad Pitt), um sujeito frio, impassível e aparentemente destemido, disposto a sempre colocar a missão à frente da vida pessoal. Sua vivência é ancorada na lembrança do pai, o também astronauta H. Clifford McBride (Tommy Lee Jones), considerado um pioneiro espacial.
Há mais de três décadas, McBride pai liderou o projeto Lima, uma ambiciosa expedição espacial com o intuito de encontrar vida inteligente em outros planetas. Mesmo após o desaparecimento e suposta morte de Clifford, a busca por respostas e por vida alienígena não cessou.
E o fantasma do pai ainda assombra o filho, determinando as suas decisões. Quando conhecemos McBride filho, ele é visto trabalhando em uma gigantesca antena utilizada com o intuito de estabelecer comunicações extraplanetárias.
De recuperação após um acidente que quase lhe custou a vida, Roy recebe a notícia de que seu pai pode estar vivo, orbitando as margens do planeta Netuno. Não só isso, mas ele também pode estar trás de uma série de ataques energéticos que atingem todo o sistema solar.
Roy é escalado para tentar fazer contato com o pai, encontra-lo e, consequentemente, salvar o universo. Sua jornada, porém, é recheada de descobertas em relação ao seu pai, em relação a ele próprio e em relação ao próprio universo.
E nisto o filme se aproxima bastante da clássica ficção científica 2001 – Uma Odisseia no Espaço. Ainda assim, a principal referência de Ad Astra – e uma que foi apontada pelo próprio diretor – é Apocalipse Now.
A estrutura do longa-metragem segue à risca a obra de Francis Ford Coppola, desde a chamada à missão, passando pelo percurso a ser seguido, as paradas pelo caminho e culminando nas transformações sofridas pelo protagonista ao longo da jornada.
E Gray ainda aborda a figura de McBride como se ele fosse uma espécie de Coronel Kurtz espacial: alguém que antes era visto como um herói, mas que agora virou uma ameaça. E a presença/ausência de Tommy Lee Jones é intimidadora, assim como era a de Marlon Brando.
A principal diferença reside no laço familiar. Pois se no filme de Coppola a hierarquia militar era o único relacionamento entre os dois personagens, aqui há uma força muito maior aproximando os dois.
Roy age da maneira como ele porque tem no seu pai a sua maior influência e o seu maior temor. O pai é o herói e o vilão da vida de Roy. E é neste espaço de conflito e admiração que a narrativa de Ad Astra – Rumo às Estrelas é construída.
A jornada de pai e filho são similares. Em ambos os casos, as viagens são sucedidas por fatalidades. Aliás, Roy parece atrair as tragédias àqueles ao seu redor, seja tendo uma ação direta (como quando invade uma nave espacial) ou quando não tem controle pelo ocorrido (quando é perseguido por piratas na Lua).
Nada disso, porém, parece afetá-lo. Não apenas os seus batimentos cardíacos mantêm-se ritmados, como suas constantes avaliações psicológicas o qualificam como apto a continuar a missão. Já a narração em off do protagonista, que nos permite entrar na sua mente e descobrir seus segredos mais íntimos.
Pitt carrega esses segredos no seu rosto e no seu silêncio. E Gray não hesita em aproximar sua câmera do rosto do ator, para captar nuances da sua atuação, como a única lágrima que escorre do seu rosto durante o clímax.
Além disso, o cineasta mantém o seu apuro estético característico, presenteando-nos com tomadas que exploram a imensidão e a beleza do espaço.
O contraste entre as cenas passadas no espaço – ou em outros planetas – e aquelas ambientadas na Terra, sempre escura e opressiva, serve para explicitar justamente aquilo que o filme busca criticar: a ideia de buscar algo (resposta, beleza, etc) naquilo que está longe, e nunca no que está ao nosso lado.
A jornada do herói se completa quando ele percebe a sua ínfima importância diante da vastidão do universo.