O documentário Três Estranhos Idênticos narra uma história que parece ter saído da ficção. Isso acontece em parte pela forma como o documentarista Tim Wardle conduz a narrativa – empregando elementos típicos de thrillers policiais e de mistério – e em parte pelo absurdo do que é mostrado.
Misturando entrevistas e reencenação, Wardle reconta o caso de Robert Shafran, David Kellman e Eddy Galland, três irmãos gêmeos separados no nascimento que só se conheceram depois de adultos. Dois deles se encontraram na faculdade e o terceiro viu a notícia no jornal, imediatamente reparando na sua própria semelhança.
O reencontro foi amplamente divulgado na mídia, dando ao trio o status de celebridades. Eles participaram de diversos programas televisivos – sempre vestindo roupas iguais –, apareceram em filmes e, aproveitando-se da fama repentina, abriram um restaurante juntos – um empreendimento bastante lucrativo, ao menos no início.
Mas a história fantasiosa ganha tons de mistério quando se investiga os motivos por trás da separação dos três – separação esta que não foi informada a nenhum dos pais adotivos. Como num thriller de espionagem, os trigêmeos são colocados em meio a uma “trama” envolvendo experimentos científicos bizarros, cientistas malucos e conspirações governamentais.
Partindo da discussão a respeito de nature vs nurture (natureza vs. criação), o filme tenta entender se a criação dessas crianças em ambientes distintos influenciou os rumos de suas vidas, ou se eles estavam presos a um destino pré-estabelecido pela genética. E embora a resposta para isso seja simples, ela é apresentada de maneira complexa.
Hábil ao manter a atenção e a tensão do espectador, Wardle se utiliza até mesmo do recurso de foreshadowing – elemento característico da ficção, no qual se insinua algo ainda por vir – para esconder pistas diante dos nossos olhos e, mesmo assim, conseguir nos surpreender a cada reviravolta.
Mas o diretor ainda manipula a nossa própria percepção daquelas pessoas e daqueles fatos. Ele brinca com a nossa pré-disposição de buscar um significado nas coincidências, por mais que, para isso, precisemos ignorar todo o contexto no qual aquilo se apresenta.
Exibido no circuito de festivais, de onde saiu bastante elogiado, o longa teve seus direitos comprados para ser transformado em um filme de ficção. A transição deverá ser tranquila. A fundação para uma boa ficção já foi estabelecida aqui e com sucesso.
Mais do que um exercício narrativo caracterizado pelo emprego de elementos da ficção, Três Estranhos Idênticos é, sim, um instigante e excelente documentário.
FICHA TÉCNICA:
Título original: Three Identical Strangers
Gênero: Documentário
País de origem: EUA
Ano de lançamento: 2018
Direção: Tim Wardle
Elenco: Robert Shafran, David Kellman, Eddy Galland, Michael Domnitz, Howard Schneider, Ellen Cervone, Alan Luchs.