Crítica | Um Crime Americano

Documentário reconta um dos casos de racismo mais conhecido nos EUA. 

Já tendo assistido ao excepcional documentário O.J.: Made In America, vencedor do Oscar do ano passado, eu pensava que já conhecia toda a história envolvendo Rodney King. Afinal, aquele filme fez um ótimo trabalho de reconstituição histórica, mostrando como os problemas raciais nos Estados Unidos são como um barril de pólvora, que só precisam de uma faísca para explodirem. Porém, ao ver este documentário Um Crime Americano (LA 92, disponível na Netflix) percebi que haviam muito mais informações acerca da revolta ocorrida em Los Angeles em 1992 que eram desconhecidas para mim, e que tornaram esse fato ainda mais aterrorizante.
Dirigido por Dan Lindsay e T.J. Martin, o longa reconta, à partir de imagens inéditas, um dos mais famosos casos de racismo e violência policial dos Estados Unidos: Rodney King era um taxista negro que foi parado pela polícia e espancado até quase morrer. Tudo foi filmado por uma pessoa morava próxima ao local. As imagens ganharam o mundo, mas quando chegou a hora do julgamento dos policiais, a “justiça” os considerou inocentes, afirmando que eles estavam apenas cumprindo com suas obrigações. Isso gerou uma revolta na cidade. A população negra levou a sua indignação para as ruas, e o resultado, após três dias de completo caos, foram diversas mortes, prédios incendiados, inúmeros saques e muito mais.

Todo isso é retratado em detalhes por meio de filmagens da época, que recontam o ocorrido. Partindo de uma extensa pesquisa, Dan Lindsay e T.J. Martin conseguem criar uma lógica visual impressionante, em sua maioria composta por imagens feitas por cinegrafistas amadores. Os diretores, que também ficaram responsáveis pela montagem do filme, ao lado de Scott Stevenson, constroem uma narrativa coesa, muitas vezes mostrando o mesmo evento sob diferentes ângulos, para nos dar uma noção maior do caos que se instaurou na cidade. Eles ainda destacam como a revolta rapidamente fugiu do controle, prejudicando até mesmo comerciantes negros que tiveram suas lojas saqueadas.
O documentário também procura explicar que aquela revolta não foi um evento isolado. Na década de 1960, algo similar já havia acontecido. Além disso, pouco depois do espancamento de King, mas antes do julgamento dos policiais, outro caso de injustiça havia sido reportado: uma juíza inocentou a dona de uma loja que havia assassinado uma jovem negra, ao confundi-la com uma assaltante. A justificativa dada pela juíza é que a impressão passada pela comerciante era a de que ela não voltaria a cometer um crime e que, portanto, não precisaria ficar presa.
Situações como estas, infelizmente, são comuns. No caso de Rodney King foram feitos diversos trâmites legais para garantir um resultado favorável aos policiais. Uma dessas ações foi mudar o local do julgamento para uma cidade vizinha, com uma pequena população negra. O júri – que deve ser formado por moradores da cidade – foi composto quase que inteiramente de pessoas brancas. E uma vez que saiu o veredito, não demorou para que toda a raiva e todo descontentamento com a justiça encontrassem na violência a sua forma mais eficaz de comunicação.
Assim, King é mostrado como a faísca que gerou a explosão. Isso não impediu, porém, que muitos dos atos de violência tenham sido cometidos em seu nome, o que colocou Rodney King numa situação bastante delicada, como é destacado em certo momento, quando ele é visto dando um pronunciamento na TV. E é justamente ao mostrar os diversos ângulos dessa história que Um Crime Americano encontra sua força. Narrativamente envolvente, este é o tipo de filme necessário de ser assistido, para que casos como este jamais sejam esquecidos.
FICHA TÉCNICA:
Título original: LA 92
Gênero: Documentário
País: EUA
Duração: 114 min.
Ano: 2017
Direção: Daniel Lindsay e T.J. Martin.

Assista ao trailer de Um Crime Americano.