Crítica | #Screamers

Terror found footage parte de uma ideia interessante, mas sofre com um desenvolvimento equivocado. 

Quando bem explorado, o found footage permite um olhar único na intimidade dos seus protagonistas por meio de uma abordagem que flerta com os limites do realismo. Porém, quando mal utilizado, ele se torna um veículo para diretores medíocres conseguirem uma justificativa para manter a produção dentro de um orçamento limitado. O terror estadunidense #Screamers, dirigido por Dean Matthew Ronalds (Going Bongo), fica num meio termo, apresentando boas ideias acerca do subgênero, mas pecando por uma execução que não as explora tão bem quanto deveria.
Escrito pelo próprio Ronalds em parceria com Tom Malloy (Ritmo do Amor), o roteiro acompanha Tom Brennan (interpretado por Malloy) e Chris Grabow (Chris Bannow), os criadores do portal de vídeos Gigaler. A proposta do site deles é fornecer aos usuários exatamente o que eles querem assistir. Para isso, algoritmos investigam a vida do usuário, descobrem os seus gostos e procuram conteúdos similares. “As pessoas não precisam acessar o site se não quiserem. Mas se eles acessarem o site, eles entendem esse acordo de que nós vamos segui-lo e nós saberemos o que você quer ver”, explica um deles. Ou seja, é a ideia da constante vigilância à qual estamos submetidos, seguindo uma lógica de colocar a responsabilidade no usuário, e não na grande corporação.

De certa maneira, a invasão de privacidade encontra ecos no formato found footage, que permite que penetremos na intimidade e na rotina daqueles personagens, neste caso sob a justificativa de que está sendo rodado um documentário sobre a empresa. Da mesma forma, a ideia de responsabilizar o outro – e nunca a nós mesmos – pode ser relacionada com o fato de que são eles próprios que estão filmando as suas vidas, o que faz deles os únicos responsáveis pelos seus destinos trágicos. Mas é preciso ir longe para fazer esse tipo de relação, já que o filme em si não se esforça para fornecer os subsídios para tais discussões. Sua preocupação maior é estabelecer uma atmosfera de suspense e mistério.
Isso acontece quando a empresa recebe um estranho screamer video (daqueles que dão sustos no espectador) de uma garota que é vista em um cemitério e, em seguida, um rosto estranho surge na tela, causando um grande susto em todos que estão assistindo. Ao postarem no site, o conteúdo viraliza e começa a ser monetizado. Empolgados com as possibilidades financeiras geradas por esse material, eles resolvem contatar os responsáveis pelo conteúdo (conseguindo suas informações por meios ilegais) e começam a conversar com a mulher que aparece naquelas imagens. Porém, ao investigarem um pouco mais, eles passam a desconfiar que a garota do vídeo possa ser a mesma que sumiu há mais de dois anos.

Fica claro, portanto, que o longa abandonou a ideia de explorar a intimidade daquelas pessoas. Porém, até mesmo a relação com a realidade (tão cara ao found footage) fica prejudicada. A começar pelo fato de que, apesar de os seus criadores dizerem o contrário, não existe nada de inovador naquilo que o Gigaler propõe. O algoritmo supostamente revolucionário deles não é diferente do que o Google ou a Netflix usam para indicar conteúdos. Além do mais, a importância dada a um simples vídeo de sustos é ridícula. Todos naquela empresa parecem surpresos com o vídeo que assistiram, como se aquilo fosse algo único e original (e não é). Aliás, o fato de um portal querer concentrar a sua produção de conteúdo em um vídeo tão banal diz muito sobre o site.
Isso tudo poderia ser entendido como uma crítica àquelas pessoas, que dedicam suas vidas a um projeto inútil e repetitivo. Mas não acho que seja esse o caso. Pois para que uma autocrítica como esta funcionasse, seria preciso um desenvolvimento melhor dos personagens, o que não acontece, especialmente em relação a Tom. Como o chefe chato que todo mundo já teve, que insiste que todos vistam a camisa da empresa e compartilhem do seu entusiasmo, não demora para que o espectador veja o protagonista do mesmo jeito que nós víamos aquele chefe: como um sujeito insuportável. E suas ações ao longo do terceiro ato corroboram essa visão, fazendo com que não nos importemos com o seu destino.
Ainda assim, o filme tem os seus bons momentos. Ao contrário dos vídeos do Gigaler, a narrativa do longa investe mais no suspense do que no susto. As situações decorrem lentamente, e em muitos casos as expectativas são quebradas de maneira positiva quando, ao final de uma cena de suspense, o susto não vem, mas a tensão se mantém. Contando com referências a títulos como A Bruxa de Blair (todo o clímax é passado numa casa abandonada), #Screamers tem boas ideias, mas não sabe desenvolvê-las direito. Se fosse para um algoritmo determinar o seu público alvo, ele seria mostrado para poucas pessoas.

FICHA TÉCNICA:
Título original: #Screamers
Gênero: Terror
País: EUA
Duração: 82 min.
Ano: 2016
Direção: Dean Matthew Ronalds
Roteiro: Dean Matthew Ronalds, Tom Malloy
Elenco: Tom Malloy, Chris Bannow, Griffin Matthews, Emanuela Galliussi, Theodora Miranne, Abbi Snee.

Assista ao trailer legendado de #Screamers: