Um homem (Guy Pearce) está sentado no seu carro, ponderando o seu próximo movimento. As rugas da idade e a pele castigada pelo sol dão ao sujeito uma aparência de cansaço. Ele desce do carro e entra num bar decadente, onde se serve de uma bebida. O local está quase vazio e em silêncio. Do lado de fora, uma camionete contendo três ladrões em fuga capota. Isso não afeta em nada o protagonista, que mantém a sua posição. Sem condições de conduzir o veículo, os três ladrões roubam o carro do homem do bar. É então que este finalmente se levanta e começa a perseguir aqueles que furtaram o seu veículo. Assim que tem início The Rover – A Caçada, western moderno dirigido por escrito e dirigido por David Michôd (Reino Animal).
Crítica | The Rover – A Caçada
A única informação fornecida antes dessa cena é que a trama em questão se passa na Austrália, “10 anos após o colapso”. A narrativa sucinta proposta pelo realizador não abre espaço para explicações, mas, em vez disso, instiga o espectador a montar os eventos na sua cabeça com o pouco que lhes é oferecido. Por exemplo, percebemos que os EUA interviram de alguma maneira no país, e o dólar americano é a moeda corrente agora; sabemos que o exército foi acionado para tentar controlar a situação, mas não está dando conta; as pessoas andam em grupos ou em duplas para se protegerem; e não existe mais uma lei vigente.
Ali também não existe amor ou amizade. Alianças até são feitas, mas funcionam na base da reciprocidade e visam a sobrevivência mútua. É o caso da parceria formada entre o protagonista e o ingênuo Rey (Robert Pattinson), irmão do sujeito que o roubou. Aqueles que vão contra essa regra, aqueles poucos que demonstram simpatia pelos demais, logo são eliminados. Com sequências que primam pela tensão, Michôd emprega um ritmo lento, mas nem por isso menos impactante. Cada uma das muitas mortes é sentida pelo público por conta da crueza com que é filmada. E a lista de cadáveres só aumenta à medida que o anti-herói segue o seu caminho em meio a estradas desérticas, rios secos, casas vazias e outros ambientes sem vida.
Nesse ambiente árido dos desertos australianos, um local onde todos carregam suas armas e se matam à vontade, o personagem de Guy Pearce surge como o pistoleiro solitário dos faroestes clássicos. Atormentado pelos seus pecados, ele carrega no olhar todo peso desse seu passado. É um homem solitário que não tem mais motivos para viver, mas não encontrou uma razão para morrer. Mas ao contrário do cowboy de John Wayne em Rastros do Ódio que não tinha mais lugar num mundo em constante evolução, a falta de esperança que vemos ao longo de todo The Rover – A Caçada evidencia que aquele cowboy moderno está mais do que pronto para a sua realidade estagnada, e isso é o mais triste.