Uma informação interessante aparece logo no início do drama A Despedida. Os dizeres iniciais avisam que o longa-metragem é “baseado em uma mentira real”. A expressão tem diferentes significados. Um deles tem a ver com a ficcionalização da adaptação cinematográfica. Afinal, qualquer obra “baseada em fatos” emprega “mentiras” para tornar a narrativa visualmente interessante.
Outro significado tem relação com a história aqui contada. Escrito e dirigido por Lulu Wang (Póstumo) com base em uma experiência pessoal, o filme acompanha Billi (Awkwafina), uma jovem de origem chinesa que mora nos EUA. Certo dia, Billi recebe a notícia de que sua avó (Shuzhen Zhao) foi diagnosticada com câncer terminal. A família, então, inventou uma mentira.
Eles inventaram um casamento entre um primo de Billi e uma garota com quem ele estava namorando há pouco tempo. A ideia é usar o falso casamento como desculpa para reunir toda a família uma última vez. Desta maneira, todos podem ficar perto da avó sem que ela desconfie do real motivo por trás daquela reunião – afinal, a família se recusa a mostrar-lhe o resultado dos exames.
A Despedida estabelece, portanto, um conflito moral. Os personagens devem contar a verdade ou deixa-la viver o restante dos seus dias feliz, alheia ao destino trágico que a aguarda? E saber da verdade a ajudaria ou apenas a condenaria a uma morte prematura?
Trata-se de um conflito cultural: a mentira é considerada um crime nos EUA, mas é uma prática comum na China. E a protagonista representa este conflito. Se por um lado Billi parece determinada a contar a verdade, ela também se vê obrigada a respeitar a cultura do seu país de origem.
Explicitando o desconforto daquela situação para todos os envolvidos, a diretora Lulu Wang adota a razão de aspecto de 2.35:1 como forma de acolher todo mundo na cena. Assim, a cineasta possibilita explora as interações entre aquelas pessoas, possibilitando ao público perceber nuances das atuações.
Como se carregassem uma bomba prestes a explodir, os personagens assumem diferentes personalidades quando estão perto da avó, precisando medir as suas palavras e controlar as emoções. De vez em quando, porém, eles não conseguem esconder a emoção e precisam esconder as lágrimas que tentavam manter guardadas.
E embora seja levantado o questionamento acerca das ações daquelas pessoas, isso não é o centro da narrativa. Mais do que uma obra sobre conflitos familiares e culturais, A Despedida trata da importância de aproveitar os momentos ao lado dos entes queridos, mesmo que estes momentos sejam baseados em uma mentira.