Colecionando prêmios e indicações por onde passa, a dramédia dinamarquesa Druk – Mais Uma Rodada marca a nova parceria do ator Mads Mikkelsen com o cineasta Thomas Vinterberg (ambos do excelente A Caça). Mas se antes a dupla contou uma história de preconceito e injustiça, aqui a proposta é diferente. Não se trata de a sociedade ostracizando o protagonista, mas dele próprio se colocando numa posição de vítima e apostando em atitudes controversas como saída para a sua imobilidade.
Escrito pelo próprio Vintenberg, em parceria com Tobias Lindholm (colaborador frequente do diretor), o roteiro acompanha Martin (Mikkelsen), um professor colegial de meia idade incapaz de manter a atenção dos seus alunos, ignorado pelos filhos e afastado da esposa. Certo dia, durante as comemorações de aniversário de um colega de trabalho, ele deixa escapar toda a frustração guardada dentro de si. Embora só aparentem serem mais felizes do que ele, os amigos propõem uma solução: o alcoolismo funcional.
O “embasamento teórico” para essa solução vem de uma teoria que afirma que o corpo do ser humano tem um déficit de álcool. Assim, de acordo com a teoria, se a pessoa preencher esse déficit, ela vai operar na sua capacidade total. Martin e seus colegas resolvem realizar esse experimento, mantendo uma cerca quantidade de álcool no seu organismo constantemente. Isso inclui beber durante o dia todo, para evitar que os níveis fiquem abaixo do esperado. Também é preciso tomar nota de tudo, visando validar o experimento sócio/científico.
Esbarrando em alguns problemas – como nas eventuais cabeçadas na parede, problemas de dicção e o perigo constante de serem descobertos –, os amigos percebem que os resultados iniciais são promissores. Martin fica mais solto e derrama seu conhecimento para os alunos com mais facilidade. Estes, por sua vez, parecem absorver melhor os ensinamentos, pensando que a mudança de atitude do professor tinha relação com uma reclamação feita por eles anteriormente – e não porque ele está bêbado o tempo todo.
Centralizando a história no bromance entre os quatro personagens principais, Druk – Mais Uma Rodada mostra como o “experimento” do grupo acaba aproximando-os ainda mais. É claro que, quanto mais eles se aproximam, mais eles afastam as pessoas ao seu redor. Mudanças de atitude são bem-vindas até certo ponto (como ilustrado na cena em que Martin faz sexo com a esposa depois de muito tempo), mas existe um limite. Não é um limite moral, mas social. A sua própria felicidade não pode significar a infelicidade de quem você ama.
Como um maestro conduzindo a sua orquestra, Vintenberg embala o filme de acordo com o tom de cada situação. Quando as coisas estão indo bem, a trilha sonora é muito mais presente e o diretor abusa de planos em contraluz, iluminando seus personagens, numa representação visual deste novo mundo aberto diante deles. Mas, quando as coisas vão mal, o estilo também se adapta. A imagem é mais crua, a câmera treme e a música desaparece. A realidade domina-os como uma forte ressaca.
Além de mostrar a ascensão e eventual queda do experimento, o realizador nunca perde de vista o real motivo de tudo aquilo. Os quatro amigos não são injustiçados e nem grandes desbravadores de novos conhecimentos. Eles são pessoas comuns procurando na bebida uma solução momentânea para seus medos e suas frustrações. Solidão, estagnação, covardia e emasculação, todos esses problemas parecem menores depois de outras rodadas.
Mas talvez a grande diferença de Druk – Mais Uma Rodada seja que o filme não se apõe totalmente às atitudes dos personagens. Assim como condena a bebedeira constante e os exageros, Vintenberg não está interessado na abstinência. O problema, para ele, não está no uso, mas no vício. Usando a bebida como uma metáfora porosa que pode absorver diversas outras temáticas, o realizador propõe um meio termo, algo que permita a manutenção da vida e não o fim dela.