Existe uma contradição entre o título nacional deste telefilme britânico da década de 1980 e sua nomeação original. E isso se relaciona com a temporalidade da tragédia e a proposta do diretor Mick Jackson (o mesmo de O Guarda-Costas).
Enquanto Catástrofe Nuclear sugere um impacto imediato causado pela explosão de uma bomba atômica, Threads (ou linhas, fios, teias) é uma alusão às ramificações ocorridas após o impacto.
E aí reside a grande qualidade dessa produção que é, até hoje, um dos retratos mais assustadores de uma possível guerra nuclear.
Threads tem como ponto de partida a história de uma família em meio a uma guerra nuclear. Acompanhamos, a princípio, a rotina de um casal apaixonado esperando o seu primeiro filho.
Os tumultos ocorridos no exterior, reportados no rádio e na TV, pouco impactam a vida dos jovens protagonistas, mais preocupados com as mudanças pelas quais as suas vidas estão passando.
Porém, a esperança de um futuro brilhante – representada na figura do bebê em gestação – é eclipsada pela ebulição do conflito internacional, culminando na explosão de bombas atômicas em território britânico.
Assim como o O Dia Seguinte (The Day After, 1983), aqui é também explicitado que a explosão, em si, é o menor dos problemas. A verdadeira ameaça vem depois.
Mas a diferença entre essa produção e o seu equivalente estadunidense é que este telefilme britânico também explora a rotina dos responsáveis pela segurança do país em suas tentativas frustradas de reestabelecer uma sociedade funcional diante do apocalipse.
São pessoas responsáveis pelas difíceis decisões tomadas em meio ao caos, escolhendo quantos cidadãos precisam ser sacrificados para que outras possam ter uma chance – ainda que mínima – de se salvar.
E à medida que aquela família do início é deixada de lado, a obra não possibilita ao público qualquer tipo de identificação com a grande maioria dos seus personagens – eliminando-os aos poucos e, muitas vezes, fora da tela.
Utilizando-se de uma estética documental, Threads mostra como a explosão rompe a teia da nossa sociedade e, um a um, os seus “fios” começam a cair.
A cada queda (impossibilidade de oferecer atendimentos médicos, escassez de comida e remédios, a ausência de serviços básicos, etc.) cai também a noção daquilo que costumávamos conhecer como civilidade.
Com velocidade acelerada, a sociedade moderna é enviada de volta à Idade das Trevas. E a câmera de Jackson, quase como um personagem, observa tudo com uma cumplicidade aterradora.
A decadência decorrente do conflito nos é apresentada em imagens que em nada diferem de notícias de jornais. O realismo é um recurso necessário à proposta do filme acerca dos perigos que cercavam o mundo naquela época – e se mantém até hoje.
E com isso é possível fazer uma aproximação com a nossa realidade atual, na qual estatísticas crescentes são ignoradas pelo público e vidas perdidas se tornam apenas um número crescente.
Por mais que seja produção feita para TV na década de 1980 e sobre o ataque nuclear, infelizmente Threads está muito mais próximo da nossa realidade do que gostaríamos de admitir.
E ao final fica o questionamento do tipo de mundo que estamos deixando para as gerações futuras.