Em uma entrevista disponível nos extras do DVD de Invocação do Mal, o cineasta James Wan conta que quando recebeu o roteiro do filme, escrito pelos irmãos Chad e Carey W. Hayes (Exorcismos e Demônios), o texto vinha repleto de cenas de sustos, com poucos intervalos para o desenvolvimento dos personagens.
Na ocasião, os roteiristas justificaram sua escolha dizendo que, por se tratar de uma obra de terror, os sustos eram fundamentais. Wan contrapôs esse argumento, explicando a necessidade de construir a tensão que culminaria nos sustos. A visão do experiente diretor prevaleceu e, no final, o resultado foi extremamente bem-sucedido.
Esta anedota comprova a necessidade de ter alguém que entenda do gênero na realização de um filme de terror. Infelizmente, este não é o caso de Os Órfãos, nova adaptação do romance A Volta do Parafuso, de Henry James, roteirizada pelos irmãos Hayes e dirigida por Floria Sigismondi (The Runaways: Garotas do Rock).
![Cena do filme Os Órfãos](http://7marte.com/wp-content/uploads/2020/02/Os-Orfaos-02.jpg)
A trama acompanha a professora Kate (Mackenzie Davis), recém-contratada como tutora de Flora (Brooklynn Prince), uma pequena órfã que vive em uma mansão isolada. Pouco tempo depois, o irmão mais velho dela, Miles (Finn Wolfhard), chega em casa e logo passa a questionar a autoridade da professora.
Kate também não encontra auxílio na governanta Mrs. Grose (Barbara Marten), descontente com a sua presença naquela casa. E, para completar, estranhas aparições e vultos começam a assustá-la, fazendo-a questionar a sua própria sanidade.
O livro de Henry James já foi adaptado inúmeras vezes. Sua versão mais conhecida é o Os Inocentes (1961), escrita por Truman Capote. Naquele caso, o roteirista explorou a tensão sexual da sua protagonista, antecedendo um diálogo histórico com a revolução sexual ocorrida nos anos seguintes. Tudo isso se perde nessa nova adaptação.
![Cena do filme Os Órfãos](http://7marte.com/wp-content/uploads/2020/02/Os-Orfaos-03.jpg)
Os roteiristas utilizam apenas um fiapo da trama do livro, criando uma narrativa que não sabe para onde caminha e culmina em lugar algum. O texto sem pé nem cabeça aposta em situações inverossímeis e inexplicáveis, apoiando-se em soluções canhestras que em nada influenciam na narrativa.
A ideia de ambientar o filme na década de 1990, por exemplo, não tem qualquer importância. A única justificativa para tal escolha é a necessidade de afastar os personagens de tecnologias modernas. Porém, isso se mostra uma alternativa preguiçosa e uma oportunidade desperdiçada, por não dialogar com a época aqui retratada.
É visível também a inexperiência de Floria Sigismondi com o gênero. A diretora aposta em uma sucessão de (tentativas de) sustos que, apresentados em sequência e sem qualquer respiro, acaba anestesiando o público. Da mesma maneira, sua falta de preocupação com o desenvolvimento dos seus personagens causa antipatia.
![Cena do filme Os Órfãos](http://7marte.com/wp-content/uploads/2020/02/Os-Orfaos-04.jpg)
Se por um lado a cineasta retrata Miles como um jovem rico e aborrecido, sua tentativa de estabelecer uma relação matriarcal entre Kate e Flora é igualmente problemática, pois o filme não parece se importar muito com as ramificações desta relação. Seu interesse maior é em tentar nos surpreender com uma reviravolta que sequer faz sentido para história.
Aliás, essa reviravolta no terceiro ato foi determinante para o longa-metragem a receber a classificação “F” (a pior possível) entre a análise do público americano. E, de fato, o final de Os Órfãos é terrível, mas é apenas um dos seus problemas, e certamente não é o único.