Entrevista | Petter Baiestorf





Cineasta catarinense é um dos principais nomes do cinema de terror nacional.

Petter Baiestorf é produtor, escritor, roteirista e diretor de produções independentes em Palmitos, Santa Catarina. Em seus filmes podemos ver críticas sociais, gore, surrealismo, comentários sobre religião, depravações sexuais e muito, muito sangue.

Em 1992, Baiestorf, ao lado de amigos, criou Canibal Filmes com o intuito de produzir zines e filmes. Surgem então as suas primeiras produções, com os fanzines Arghhh, Necrifilia e o filme incompleto Lixo cerebral Vindo de outro Espaço. Seu primeiro filme completo, Criaturas Hediondas, foi lançado em 1993.

A ideia de produzir de maneira independente sempre agradou Baiestorf. Como ele mesmo diz: “Sou um grande fã de bandas punks e de metal obscuras, aí todo este universo do ‘faça você mesmo’ me contagiou e, como sempre fui apaixonado por cinema, resolvi eu mesmo fazer meus filmes. Não há nada de especial não, só resolvi colocar as ideias em prática e cá estou 22 anos depois fazendo meus filmes gore com putaria”.

Nesses 22 anos a Canibal Filmes produziu fanzines, documentários, um livro intitulado Manifesto Canibal, escrito por Baiestorf e Coffin Souza, e mais de 100 filmes, sendo eles curtas, médias e longas-metragens.
Baiestorf é produtor dos filmes mais conhecidos no cinema underground, entre eles:

Eles Comem Sua Carne (1996)
Zombio (1999)
Raiva (2001)
Arrombada: Vou Mijar na Porra do Seu Túmulo!!! (2007)
Zombio 2: Chimarrão Zombies (2013) – seu mais recente filme.

Atualmente ele prepara a antologia de terror As Fabulas Negras, composta de três episódios dirigidos por ícones de cinema de terror nacional. Além de Baiestorf, também participam da antologia os cineastas Rodrigo Aragão (Mangue Negro) e José Mojica Marins, o Zé do Caixão (Encarnação do Demônio).

E agora, para conhecer um pouco mais desse cineasta catarinense, segue uma entrevista realizada pelo amigo Sergio Mendes para o 7 Marte.

Como é fazer cinema independente em SC, principalmente em Palmitos?
Fazer cinema independente aqui, assim como em qualquer outro lugar, é uma constante luta contra o sistema. Você vai ter que arranjar o dinheiro pro filme do jeito que der, depois não vai conseguir distribuidor e terá que lançar de forma independente mesmo, se conseguir. Depois todos que deveriam comprar o filme pra te ajudar a fazer mais uns filmes só vão perguntar onde ta o link pra download. Sem contar que quando tu botar o filme pra download vai ter muita gente pedindo pra tirar de servidor “X” pra botar no servidor “Y” porque assim eles preferem. Só rindo pra não chorar! Tenho residência em Palmitos/SC, mas meus últimos filmes não são produções catarinenses. “Zombio 2: Chimarrão Zombies”, que produzi em 2013, foi uma cooperativa envolvendo produtoras independentes de 8 estados brasileiros. “Pampa Feroz”, episódio que faz parte do longa “As Fábulas Negras” é uma produção capixaba. Me considero um produtor do mundo, posso fazer meus filmes em qualquer lugar. Sou contra fronteiras, sou contra gêneros, tudo isso foi criado pra te limitar.

Você recebe algum apoio do governo, ou suas produções são custeadas apenas por você?
Não, nunca recebi nenhum centavo de ajuda do governo, todos meus filmes, fanzines e livros foram feitos com grana pessoal ou de investidores particulares. Faço muitas parcerias na hora de filmar/produzir. Com “Zombio 2”, por exemplo, fechei parceria com 4 outras produtoras independentes: Bulhorgia Produções do Gurcius Gewdner, El Reno Fitas do Leo Pyrata e Flávio Sperling, Camarrão Filmes do Alexandre Brunoro e Raphael Araújo e a Suigeneris Filmes do Sanzio Machado que deu todo o suporte de equipamentos pro filme. Nesta mesma produção ainda recebemos ajuda de material das produtoras Fábulas Negras do Rodrigo Aragão, Necrófilos Produções do Felipe Guerra, Zumbilly do Andye Iore e Gosma do Douglas Domingues. Então tivemos uma produção independente que custou 30 mil reais e que foi feita num sistema de cooperativismo e amizade.

Quais parcerias você procura nas produções e quanto tempo para as filmagens e finalizações de seus filmes?
Procuro parceiros que pensem como eu. Dificilmente fecho parcerias com produtoras que não tenham o mesmo modo de trabalhar que eu porque simplesmente não funciona. Cara apresenta o projeto, fala das dificuldades e une as misérias e produz. Todo mundo poderia estar trabalhando num sistema de cooperativismo mandando o lucro pras cucuias. Geralmente, em média, termino as filmagens de um média em 5 dias e depois mais uma semana pra editar e finalizar. Se fosse viável cara poderia fazer um filme por mês, pequenos filmes de exploração e experimentações, produções rápidas e despretensiosas. Talvez um dia terei condições de realizar isso, um média a cada 3 meses, ou dois longas por ano pra desovar num canal de net por assinatura ou algo assim. “Zombio 2” que foi mais complexo e precisamos de 25 dias de filmagens pra concluir tudo, era gente demais na produção (acabamos o filme contabilizando 72 pessoas entre atores/atrizes e técnicos) e quase 100 sequências para filmarmos.

Qual o orçamento médio para a produção de um longa-metragem?
Em média gastamos uns 5 mil reais em cada média-metragem. “Arrombada – Vou Mijar na Porra do Seu Túmulo!!!” deu pra fazer com 1500 reais, montei uma equipe minúscula e poucos atores e filmamos tudo em 5 dias, foi possível. “Vadias do Sexo Sangrento” e “Ninguém Deve Morrer” custaram uns 5 mil reais cada, só pra citar os últimos. “Zombio 2”, que é um longa-metragem, custou 30 mil reais porque foi feito em sistema de cooperativismo, caso contrário teria custado uns 70 mil reais. Agora vou rodar um episódio para o longa-metragem coletivo “13 Estórias Estranhas” que vou filmar com uma equipe bem pequena. A cada produção vemos o que é possível fazer e apartir das condições montamos o circo todo.

Como é feita a distribuição de seus filmes?
É distribuição independente, tem que comprar diretamente comigo. Quem quiser mande e-mail pra baiestorf@yahoo.com.br

A internet ajuda ou atrapalha as produções independentes?
A internet é apenas uma ferramenta, cabe a nós usarmos ela direito. Ainda estamos aprendendo, é tudo tenta/aprende, como na vida. Tenho algumas idéias pra testar via internet, umas tentativas de levantar alguns centavos pra produção dos filmes. Vamos ver!

Você é proprietário de uma videolocadora, certo? O que diria sobre o futuro das videolocadoras no Brasil?
Eu era proprietário, a locadora já fechou por falta de freguês. O futuro das locadoras é virar loja de conveniência.

O Manifesto Canibal ajudou no surgimento de novos produtores independentes?
O livro acabou sendo uma referência importante pra nova geração de realizadores. Sempre que estou em mostras e festivais aparecem jovens que dizem que começaram a produzir inspirados no Manifesto ou nas nossas produções. O Manifesto Canibal é uma celebração pelo cinema livre de amarras e das regras, faz um apelo por um cinema sem fronteiras, sem moralismos, um cinema adulto livre desta pegada infantilóide de Hollywood. Manifesto Canibal é a resistência, é uma maneira de se pensar e realizar cinema com as condições que se tem. “Zombio 2” foi feito neste sistema e rodou o mundo, já foi exibido em mais de 40 festivais mundo afora.

Quais suas influencias e o que você acha do cinema nacional?
Absolutamente tudo me influência. Lógico que tem alguns cineastas que admiro, como Jesus Franco, Jean Rollin, Koji Wakamatsu, entre outros, mas não gosto de tratá-los como mestres, não gosto da figura “mestre infalível”, “gênio total”, etc… Gosto muito de produções vagabundas que, mesmo cheias de problemas, acabaram sendo filmes esforçados, muito além do “bom filme” ou “péssimo filme”. Neste quesito Jesus Franco foi uma lenda. E nestas duas décadas em que realizo filmes, uma coisa que aprendi foi: Tanto faz se tu faz um bom filme ou um filme ruim, é como tu vende o filme que conta. Já vi muito filme bom morrer na praia e muito filme ruim ganhar o mundo. Do cinema nacional sou fanático pelas produções realizadas na Boca do Lixo, principalmente anos de 1960, 1970 e 1980, incluindo aí a pornografia explícita… sou um grande apreciador da pornografia nacional. Também curto o cinema marginal brasileiro, meio que vejo de tudo, adoro a história do cinema brasileiro. Atualmente que não tenho acompanhado muito essas produções feitas com grana de edital, não são filmes pra mim. Os que vi achei todos bem ruinzinhos, então prefiro ficar vendo produções independentes, prefiro dar meu dinheiro pras produções independentes.

Quais filmes você tem assistindo e quais bandas escuta ultimamente?
Vejo e ouço tudo que é tipo de coisa, não sou um cara unidimensional. Como falei acima, absolutamente tudo me interessa, não gosto de ficar bitolado em apenas um gênero ou um estilo musical, é pobre demais.

O que você acha do estilo de cinema que você faz? O uso de cenas fortes e escatológicas?
Olha, espero continuar fazendo filmes cheios de cenas escatológicas, gosto muito de pegar o espectador pelo estômago. Não gosto de filmar sem usar do humor negro e de cenas repulsivas, é parte do meu estilo de contar histórias. Ainda vou, dia destes, fazer uma comédia romântica escatológica, tenho umas ideias na cabeça e sei que vai ficar hilário. Gosto de ver filmes sérios, mas não me vejo fazendo filmes sérios.

O que você acha da censura em seus filmes?
De tempos em tempos minhas produções são censuradas em algum local. E a cada ano que se passa a censura tem aumentado. Na próxima década nosso país (e o mundo) vão mergulhar nas trevas da ignorância se ninguém reagir. Como costumo falar aos jovens: Estudem, estudem tudo e procurem cada vez mais conhecimento pelos canais alternativos, se a sociedade te ensinou a odiar algo, vá lá e conheça o que você odeia direito e aprenda a entender/respeitar as diferenças. Eles podem tirar tudo de ti, menos sua inteligência!!!

Você refilmaria algum de seus trabalhos antigos?
Tenho na ideia de refilmar “O Monstro Legume do Espaço”, que é um longa que realizei em 1995. Como imagino essa refilmagem um pouco mais mirabolante do que o original, ainda não consegui levantar o dinheiro necessário pra realizá-lo. Inúmeras produções que banquei foram filmadas em tão pouco tempo que, geralmente, não saíram como imaginei simplesmente porque não havia tempo e dinheiro para fazer com calma e os improvisos nem sempre são a melhor resposta. Improviso dá certo as vezes, não sempre.

Fale um pouco sobre sua nova produção “Pampa Feroz”, que estará na antologia “As Fabulas Negras”?
“Pampa Feroz” é um dos episódios pro longa “As Fábulas Negras” que o Rodrigo Aragão está realizando. Fui contrato por ele só pra escrever e dirigir este episódio, não estou por dentro das datas de lançamento e como vai ser a distribuição. “Pampa Feroz” conta uma história envolvendo um triângulo amoroso e um lobisomem, é um filme de horror mais clássico que explora um pouco do nosso folclore.

Além de Pampa Feroz, quais seus futuros projetos?
Agora filmo o episódio pro longa coletivo “13 Estórias Estranhas” e pra 2015 deve sair meu livro “Arrepios Divertidos” pela editora Estronho. Depois disso vou reinventar minha vida.

Qual conselho que você daria para quem quer fazer cinema independente?
Deixa de preguiça e vai fazer. Geralmente o maior empecilho na realização dos projetos é somente a preguiça.

Uma mensagem para as pessoas:
Sempre que tu encontrar um produtor de cultura independente pague algumas cervejas pra ele!

O 7 Marte agradece a oportunidade dessa entrevista. Para mais informações, acesso o site da Canibal Filmes ou o da Canibuk.

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