Crítica | Bully

Ainda que seja algo comum em diversos países, a prática do bullying – violência física e/ou psicológica entre crianças e adolescentes – nos Estados Unidos é vista quase como uma questão cultural. Entretanto, a pressão recebida pelos jovens vítimas desse tipo de agressão é tão grande, que muitas vezes eles acabam tomando decisões drásticas. E como é preciso o choque para tirar as pessoas da apatia, é somente quando a situação atinge o seu extremo que o assunto vem à tona, e suas causas e conseqüências começam a ser estudas.

Partindo desse princípio, o documentário Bully, produzido, filmado e dirigido por Lee Hirsh, inicia sua projeção com o depoimento de um pai, cujo filho, vítima de bullying, se suicidou por não aguentar mais as constantes provocações dos colegas de escola. A partir disso, Hirsh (que também escreveu o roteiro, em parceria com Cynthia Lowen) passa a acompanhar a vida de outras pessoas que enfrentam o mesmo problema, como o garoto que é agredido todo dia no ônibus; a adolescente que se assumiu lésbica e enfrenta o preconceito da cidade; a menina que, cansada daquela realidade, resolveu revidar e agora sofre as consequências disso; os pais que se tornaram ativistas contra a violência depois do suicídio de seu filho; entre outros casos.

Fica claro logo no início que a intenção do diretor é conscientizar as pessoas a encararem o bullying como um mal que assola a sociedade americana contemporânea (e não apenas como “brincadeira de crianças”). Visando atingir o máximo de pessoas possível, o cineasta entrega um documentário que, por vezes, soa esquemático demais – como um garoto afirma que às vezes ele gostaria de ser o bullie, e em seguida mostra uma garota presa por ter reagido de maneira radical às opressões que sofria –, o que sacrifica um pouco da narrativa, visto que, se ele já oferece as respostas, isso não deixa espaço para discussão. Porém essa não é maior falha do filme.

Curiosamente, o principal defeito de Bully é também sua maior qualidade. Ao tratar do tema como uma questão social, e não pessoal, Hirsh opta (acertadamente) por não divulgar informação nenhuma sobre qualquer uma das pessoas que atormentavam os garotos que se suicidaram. Dessa maneira, além de proteger a vida desses jovens – que poderiam se tornar vítimas de pessoas que decidissem tomar a justiça pelas próprias mãos –, ele também torna o tema mais abrangente, apresentando-o como algo que pode acontecer com qualquer um, em qualquer lugar. O problema é que, com isso, ele também ignora o fato de que muitas vezes a violência gerada por esses jovens é fruto da educação que eles recebem (ou não recebem) em casa. Escolhendo não abordar a influencia dos pais na educação dos filhos, o cineasta opta por mostrar a Escola – ilustrada aqui na figura de uma diretora um tanto incompetente – como a única vilã da história, o que sabemos que não é verdade.

Além disso, o aparente despreparo do diretor para operar a câmera compromete alguns momentos chave do longa: diversas vezes, em meio a alguma declaração ou mesmo quando os personagens estão chorando, Hirsh perde o foco da câmera (que parece estar ajustada no automático), o que faz com que o espectador acabe desviando sua atenção para um quesito técnico ao invés de prestar atenção ao que está sendo dito. Tal recurso até poderia ser usado narrativamente para ilustrar o estado de espírito daqueles personagens, mas, uma vez que se percebe que isso acontece com bastante frequência, nota-se que se trata mesmo falta de afinidade com o equipamento.

Defeitos a parte, Bully funciona bem no que se propõe. Passando a mensagem de que cada um deve fazer a sua parte para abolir esse problema, a própria equipe de filmagem, em certo momento, acaba se envolvendo também. E nesse caso, é interessante notar a rapidez com que a direção da escola procura tomar providências para resolver a situação, ilustrando a influência que o filme teve naquele momento. Esperamos, então, que ele continue atingindo esse objetivo.

(Idem – Documentário – EUA – 2011 – 99 min.)
Direção: Lee Hirsh
Roteiro: Lee Hirsh e Cynthia Lowen
Elenco: – documentário –

Nota: (Bom) por Daniel Medeiros